quinta-feira, abril 30, 2009

TODA A ATENÇÃO É POUCA:

A gripe
Provavelmente só porque é fim de semana é que os meus amigos, conhecendo-me como virologista, ainda não me questionaram sobre a gripe "suína". Infelizmente, o termo é errado. No caso da gripe aviária que apareceu há poucos anos, houve infecção de algumas centenas de humanos, mas sem que o vírus pudesse passar desses humanos a outros. Agora é diferente. De suína, esta gripe só tem a origem. De facto, ela é bem humana. Na história da gripe, o aparecimento das grandes epidemias mundiais (pandemias) foi quase sempre por adaptação ao homem de vírus suínos da gripe. Por isto, as expectativas em relação ao vírus aviário H5N1 (sigla que identifica os dois principais antigénios do vírus, e que definem se temos ou não imunidade contra ele) eram a de, com alguma probabilidade, na situação do Extremo Oriente de grande concentração conjunta de aves, porcos e humanos, o vírus aviário H5N1 passar para o porco e deste para o homem, adquirindo capacidade de transmissão homem a homem. Afinal, como tantas vezes acontece na emergência de novos vírus, a situação foi surpreendentemente diferente. O que aparece é um novo vírus humano - insisto, humano, transmissível de homem a homem - com origem no porco mas no outro lado do globo, no México. Também não é um H5N1 e por isto, como eu e muitos escrevemos na altura, era tolice investir em vacinas contra um vírus que ninguém sabia o que viria a ser - mas sim um H1N1, desaparecido da história da virologia há quase um século. Foi o tipo de vírus que causou a terrível pandemia de 1918, a espanhola, que matou mais gente na Europa do que a guerra mundial que tinha terminado pouco antes. É certo que tem havido, nos últimos invernos, algumas infecções com H1N1, mas não é o tipo hoje mais vulgar e nada garante que o novo vírus seja neutralizado por vacinação com os últimos H1N1 circulantes. Hoje, os dados oficiais mexicanos revelam cerca de 1300 infectados com 81 mortes, uma taxa de letalidade já considerável. Também já há casos nos EUA. O que significa isto? Não quero ser alarmista, mas os meus leitores têm o direito ao que de mais objectivo eu, especialista, possa dizer. Considero uma situação muito preocupante, porque estamos perante condições muito diferentes do que eram as tradicionais na emergência de novas pandemias de gripe. A sua origem não é em zonas rurais da Ásia mas sim numa área metropolitana de 20 milhões de pessoas, em estreito contacto favorecedor de transmissão por via respiratória. Em segundo lugar, os vírus hoje viajam de avião. Finalmente, como disse atrás, trata-se de um tipo de vírus contra o qual há dezenas de anos que não há qualquer resistência imune nem há vacinas rapidamente disponíveis. Que fazer, em Portugal? Para já, a nível individual, nada. A nível das autoridades de saúde, vigilância, controlo a nível de medicina das viagens, planeamento desde já de condições de hospitalização e isolamento de milhares de possíveis doentes (atenção, vai ser a esta escala, transformando a FIL em hospital). O que faria agora eu, como indivíduo? Obviamente, cancelar qualquer viagem marcada para o México ou para o sul dos EUA. Informar-me junto do meu médico sobre todos os sinais de alerta, os sintomas da gripe, que muita gente confunde com os de uma vulgar constipação. Se começar a haver casos em Portugal, usar máscara, deixar de frequentar locais com muita gente, isolar em casa, como prisioneiros, os nossos pais septuagenários. E, se a religião ajuda, rezar frequentemente. Mas também ter em conta que o mesmo progresso e actual modo de vida que nos vai trazer o vírus de avião também vai permitir o diagnóstico muito precoce da doença, a produção limitada mas razoável de medicamentos e de vacinas.
P. S. - Já imagino o que vai haver por aí de pânico em relação ao consumo de carne de porco! Mesmo que a gripe fosse suína, não era pela carne que se transmitiria. Mas, como chamei a atenção, "suína" é neste caso uma referência enganosa, tem a ver só com a origem. Quem a vai ter são os humanos, não os pobres suínos.
23.4.2009 Prof. João Vasconcelos Costa - Doutor e Agregado em Medicina (Microbiologia)

quarta-feira, abril 29, 2009

Que vou responder ao meu amigo???

Recebi de um grande amigo um email colocando-me a seguinte questão, para a qual chamo a vossa atenção:

…” Estava há dias a falar com um amigo Nova-iorquino que conhece bem Portugal. Dizia-lhe eu à boa maneira portuguesa de “coitadinhos” : - Sabes, nós os portugueses somos pobres ...

Esta foi a sua resposta:

Filho como podes tu dizer que sois pobres, quando sois capaz de pagar por um litro de gasolina, mais do triplo do que pago eu? Quando vos dais ao luxo de pagar tarifas de electricidade, de telemóvel 80 % mais caras do que nos custam a nós nos EUA? Como podes tu dizer que sois pobres quando pagais comissões bancárias por serviços bancários e cartas de crédito ao triplo que nos custam nos EUA?

Ou quando podem pagar por um carro que a mim me custa 12.000 US Dólares e vocês pagam mais de 20.000 EUROS, pelo mesmo carro? Podem dar mais de 8.000 EUROS de presente ao vosso governo e nós não. Filho, francamente não te entendo! Nós é que somos pobres: por exemplo em New York o Governo Estatal, tendo em conta a precária situação financeira dos seus habitantes cobra somente 2 % de IVA, mais 4% que é o imposto Federal, isto é 6%, nada comparado com os 20% dos ricos que vivem em Portugal. E contentes com estes 20%, pagais ainda impostos municipais. Além disso, são vocês que têm “ impostos de luxo” como são os impostos na gasolina e gás, álcool, cigarros, cerveja, vinhos etc, que faz com que esses produtos cheguem em certos casos até certos a 300 % do valor original., e outros como imposto sobre a renda, impostos nos salários, impostos sobre automóveis novos, sobre bens pessoais, sobre bens das empresas, de circulação automóvel. Um Banco privado vai à falência e vocês que não têm nada com isso pagam, outro, uma espécie de casino, o vosso Banco Privado quebra, e vocês protegem-no com o dinheiro que enviam para o Estado. E vocês pagam ao vosso Governador do Banco de Portugal, um vencimento anual que é quase 3 vezes mais que o do Governador do Banco Federal dos EUA... Sois pobres onde? Um país que é capaz de cobrar o Imposto sobre Ganhos por adiantado e Bens pessoais mediante retenções, necessariamente tem de nadar na abundância, porque considera que os negócios da nação e de todos os seus habitantes sempre terão ganhos apesar dos assaltos, do saque fiscal, da corrupção dos seus governantes e autarcas. Um país capaz de pagar salários irreais aos seus funcionários de estado e da iniciativa privada.
Deixa-te de merdas. Filho, sois pobres onde? Os pobres somos nós, os que vivemos nos USA e que não pagamos impostos sobre a renda se ganhamos menos de 3.000 dólares ao mês por pessoa, isto é mais ou menos os vossos 2.370 Euros. Vocês podem pagar impostos do lixo, sobre o consumo da água, do gás e electricidade. Aí pagam segurança privada nos Bancos, urbanizações, municipais, enquanto nós como somos pobres nos conformamos com a segurança pública.
Vocês enviam os filhos para colégios privados, enquanto nós aqui nos EUA as escolas públicas emprestam os livros aos nossos filhos prevendo que não os podemos comprar.
Vocês não são pobres, gastam é muito mal o vosso dinheiro. Ou então, vocês Portugueses são uns estúpidos ou uns mansos de merda! …”

Que vou responder a este amigo? Por favor mandem sugestões.

sábado, abril 25, 2009

PROFESSOR: ALVO A ABATER

Aqui vai mais uma cena macaca igual a tantas outras nas nossas Escolas:


Artigo publicado em http://arteagostinho.blogs.sapo.pt/

Nesta sexta-feira dia 13 de Março de 2009 pensei que seria uma experiência interessante registar o que me acontece num dia ou numa semana de trabalho típica. Devo dizer que a minha profissão é a de professor, pelo que, nos tempos que correm, sou um alvo a abater. Adiante.
Nesta sexta-feira, as principais ocorrências de carácter disciplinar (que é como se chama modernamente à má educação, marginalidade e brutalidade), foram as seguintes:


- 8.00 horas - O aluno Raimundo da turma especial do 6º ano espancou o aluno Eduardo, da minha Direcção de Turma, a 2 metros do portão da escola. Sem qualquer motivo. Apeteceu-lhe.

- 12.30 horas - O aluno Raimundo da turma especial do 6º ano, na cantina da escola, entornou alguma água no seu tabuleiro, e exigiu que o aluno Hermínio, da minha Direcção de Turma, limpasse a água com um guardanapo. Como este se tivesse negado, regou-lhe a comida toda com o conteúdo inteiro de uma garrafa de litro e meio de água. A comida ficou impossível de ser consumida, pelo que o almoço do aluno foi meio papo-seco oferecido por outro aluno.

- 14.30 horas - Tive conhecimento do sucedido, redigi as participações disciplinares e procurei o aluno Raimundo, que tem 17 anos, anda no 6º ano, mede 1.80m e desde que entra até que sai da escola tudo o que faz é agredir, insultar, ameaçar e destruir. Perguntei-lhe o que se tinha passado.
Respondeu-me: "Bati no Eduardo do portão para fora, por isso você não tem nada a ver com isso, e aquilo da água na comida do Hermínio é mentira".
Avisei-o para que não tocasse mais nos meus alunos. Riu-se e disse:
- "É só se não me apetecer". -Redigi nova participação disciplinar. Será mais uma para o monte. Inútil.

- 15.25 horas - Na fila para o bar, o aluno da minha Direcção de Turma Carlos Daniel, foi espancado por um aluno dos Cursos de Educação e Formação, de nome Fábio, sem qualquer motivo. Apenas por desfastio. Nova participação disciplinar, relatório, recado nas cadernetas, cópias para o Director de Turma do agressor, para o Conselho Executivo, para o meu dossier, cartas registadas.

- 16.00 horas - A minha aula é interrompida por uma gritaria enorme. Ouço uma mulher a chorar. Ao lado de um cacifo destruído, o aluno que agredira os meus dois, de manhã, ria-se na cara da funcionária, que entrara em desespero por ele estar a destruir o cacifo e não lhe obedecer. A funcionária chorava convulsivamente, na medida exacta em que ele a insultava, chamando-lhe um pouco de tudo o que se possa imaginar. Chamei o vice-presidente, que pediu ao aluno para o acompanhar. O Raimundo afirma peremptoriamente que não fez nada (!!!). Chama-me mentiroso. Diz que me f**** os cornos à saída.

- 16.30 horas - O aluno Fábio (o da agressão ao Carlos Daniel) é expulso da sala de aula contígua. Recusa-se a sair. A professora pede ajuda e as funcionárias fogem. Naturalmente, acudo. O indivíduo, refastelado numa mesa e a rir-se às gargalhadas, galvaniza toda a turma numa espécie de delírio colectivo. É o caos. Peço licença à colega, pego nele e ponho-o na rua.
- Você tem a mania que é esperto, qualquer dia f***-se! Sempre a meter-se onde não é chamado!... Mais uma participação disciplinar, com todo o cortejo de procedimentos burocráticos associados, e para nada. Entrei às 8.15 horas. Às 17.30 acabou o meu período de aulas, com 50 minutos de almoço. Dei sete blocos de aulas, no meio de indisciplina, e todos os meus intervalos, mesmo o do almoço, foram ocupados a preencher papéis referentes a estes casos mais flagrantes de indisciplina. Não têm conta os palavrões que ouvi, as gritarias nos corredores, os insultos velados ou pelas costas de modo a não se identificar quem insultou, ou não se "ter provas". É fácil de imaginar o estado de nervos em que se trabalha. A disposição, a clareza de raciocínio, a inspiração, tudo se dissolve debaixo desta contenção forçada, deste caos, desta selva sem lei a que se está sujeito. Todos os dias. Segunda Feira 16\03
Nesta segunda-feira apresentei-me ao serviço às 8.15 horas, como sempre, e com a esperança sincera de não ter que escrever nada na entrada de hoje. É todos os dias a mesma coisa. Todos os dias eu desejo que seja um dia sem "casos". Não foi:

- 10.3o horas - Duas alunas entram na sala aos gritos, numa discussão do tipo Morangos com Açúcar, teatralizada até à náusea, com asneirões pelo meio. Duas faltas disciplinares, procedimentos burocráticos da praxe, e os habituais protestos de que "não estavam a fazer nada", mais as ameaças de chamar alguém do Conselho Executivo para as pôr fora da sala.

- 12.30 horas - Passo nas imediações da cantina, e na fila, um aluno do 9º ano, velho conhecido, bate com as cabeças de dois alunos do 5º ano uma contra a outra. Ria-se para as colegas de turma e afirmava estar a "descarregar o stress". Trata-se de um aluno cujos pais vêm sempre à escola ameaçar com queixas e com tribunais todos os professores, funcionários ou alunos que reajam aos numerosos abusos que comete todos os dias e a toda a hora. É genuinamente mau. Famoso nas redondezas por alvejar gatos e cães com tiros de carabina (oferecida pelo pai especialmente para o efeito).
Uma queixa de um aluno destes implica meses de transtornos diversos, devassas da vida pessoal, ameaças anónimas, etc.. Acerco-me e pergunto o que se passa. Meio tontos, os garotos do 5º ano afirmam que estão todos "a brincar". Não adianta prosseguir. Sustentarão essa versão até ao final das suas vidas, se preciso for, para evitar serem seriamente espancados pelo Abílio, o agressor. Afasto-me, debaixo dos risos sarcásticos dos meninos e das meninas da turma do "herói".

- 13.o5 horas - Uma rapariga que coxeia e tem uma acentuada deficiência numa perna, passa nas escadas e um aluno do CEF (Cursos de Educação e Formação), com ar mais boçal que se possa imaginar, dispara:
- Hã... hã... cande é que quemeças á andar como deva ser?... Fico aturdido, incrédulo, e escapa-se-me: - Desgraçado! - Qué que foi? - responde o aluno do CEF, com toda a insolência. - Então tu estás a fazer troça de uma rapariga deficiente? - digo eu. Resposta dele: - Eu não lhe chamei deficiente. Só disse cando é quela quemeçava á andar como deva ser! Não vale a pena apresentar queixa. Por estranho que possa parecer, o "argumento" dele ganhava, no actual estado de loucura que tomou conta das escolas.

- 14.45 horas - Alunos de uma turma CEF que foram expulsos de uma aula, correm pelos corredores, empoleiram-se nos muretes e pontapeiam as portas das salas. As funcionárias procuram correr em sentido contrário, por forma a não poderem testemunhar nada nem intervir. Alguns professores, timidamente, assomam às portas. Sabem que nada podem fazer sem correrem riscos sérios de agressão e outras represálias. Procuro conter-me.

- 14.55 horas - O barulho, as correrias, as patadas nas portas, as pancadas nos vidros, continuam. Saio da sala e peço a caderneta do aluno a dois dos "foliões". Um deles sai-se de pronto com o clássico:
- "Eu não fiz nada!". E ri-se, com ar de gozo. Passam-me coisas pela vista, as pernas fraquejam, sinto um nó no estômago e tonturas. Pego na lata de Coca-Cola que ele tem na mão, esmago-a com a minha mão, e peço-lhe de novo a caderneta. São quatro cadernetas a preencher. Mais uma quantidade de burocracia. Volto à sala de aula, estou no meio de uma explicação particularmente complexa, e uma aluna resolve levantar-se para me perguntar se vi o estojo dela (!!!). Continuo a falar e ela a perguntar, ininterruptamente. Chega-se ao pé de mim e no meio da explicação só digo: "Por amor de Deus, vai-te sentar". A aluna continua a matraquear, quase em cima de mim: "Onde está a minha bolsa? Onde está a minha bolsa? Onde está a minha bolsa?".
Mais uma falta disciplinar. Os alunos resmungam que é uma "injustiça". Apetece-me sair da sala imediatamente e ir para casa. A muito custo, contenho-me. Sinto que me vai rebentar qualquer coisa na cabeça.

- 16.45 horas - O funcionário pede a minha ajuda para desalojar três rapazes, um do CEF e dois do 5º ano (!!!), que sequestraram três raparigas nas casas de banho femininas. As raparigas gritam que se desunham, mas quando chegamos à porta, saem com ar de quem acaba de descer da montanha russa. Eles recusam-se a acompanhar-nos à Gestão. Não podemos tocar-lhes, ou seremos acusados imediatamente de agressão. Mais papéis, relatórios, participações, cartas registadas, entrevistas, acariações. A Psicóloga da escola está no Gabinete do Executivo, quando vou entregar a papelada. Acusa-nos de não sabermos lidar com os miúdos, que "têm muitos problemas em casa".
Tenho 50 anos. Não é fácil mudar de emprego nesta idade.
Hoje "almocei" e "lanchei" Actimel. Não dei propriamente aulas. Mantive animais selvagens dentro de uma sala, em cativeiro. Post-Scriptum: Já estou em casa. São 20.20 horas.. Entrei às 8.15 e tenho ainda um serão de testes e trabalhos para ver, mais as burocracias de actas e outras. Uma vista de olhos pelas notícias do Público, e verifico que uma aluna CEF agrediu violentamente uma professora em Aveiro. Medina Carreira terá dito que as escolas actualmente são uma bandalheira. Eu acrescento que são um inferno.
(.... ) Terça Feira 17\03 Não é por ter decido relatar esta semana em termos de indisciplina que estou mais atento para ela, ou que guardo alguma expectativa. Sobretudo por causa disso até gostava de ser agradavelmente surpreendido com um dia sem problemas de maior. Infelizmente ainda não foi hoje...
8.15 horas - Quando passo o portão, os quatro alunos da ocorrência ("ocorrência", até já usamos linguagem policial) de ontem 14.55 horas lançam um grito:
- Ó setôr, quando é que dá as cadernetas que ontem roubou à gente?
Hesito. O que fazer? Os pais olham, com ar crítico, e imagino-lhes a conversa, "Ao que isto chegou... "Eles" não se dão ao respeito e depois admiram-se...". O costume.
No caso de eu ir pedir satisfações aos meninos, estes rir-se-iam na minha cara.
No caso de eu apresentar a queixa, na Gestão achar-me-iam "picuinhas".
No caso de eu espetar duas lambadas nos meninos, era uma chatice das antigas...
10.20 horas - O Carnaval foi há umas semanas. Um aluno apareceu-me completamente encharcado. Não foi um balão de água. Foi um saco de água. "Brincadeiras"...
12.15 horas - Uma pedra do exterior atingiu um aluno na cabeça. Ninguém viu...
13.50 horas - No intervalo, o tal aluno de nome Raimundo, da turma especial, andava a apalpar e beijar as funcionárias todas. Vi de longe e fui pela escada, dei a volta pelo 1º andar, para não ser obrigado a passar calado, ou, em alternativa, apresentar mais uma participação e esta ser desmentida pelas funcionárias, que têm medo dos alunos - e é caso para isso.
14.30 horas - O barulho é insuportável. Saio da sala para ver o que se passa. Uma festa de boas-vindas a um aluno que esteve gravemente doente, descambou num caos. É uma turma do 5ºano. À janela, um dos alunos grita obscenidades a quem passa, enquanto a professora tenta desesperadamente pôr ordem na turma, que perdeu o controlo. O aluno que está à janela é um dos que ontem invadiu a casa de banho das raparigas. Os pais, quando (raramente) resolvem aparecer na escola para tomar conhecimento do comportamento dele, dizem para a Directora de Turma: - Só se a gente matar o rapazeco...
É gente que vive do tráfico de drogas. Às 16.30 horas acabei as aulas do dia.
O saldo não foi mau, em termos relativos. Agora estou a escrever estas breves linhas no intervalo de trabalho administrativo. Estou a tirar faltas e a lançá-las no sistema informático, e a redigir cartas para os Encarregados de Educação para enviar em correio registado. Hoje almocei, dei seis blocos de aulas e tenho agora duas horas de trabalho em que ninguém me aborrece, como em qualquer profissão. É pena que seja trabalho burocrático, repetitivo, redundante e sem interesse para mim. Eu escolhi ser professor. Não o tenho conseguido ultimamente.

domingo, abril 19, 2009

Mais Uma Gooolpada ! O país está a saque....!!]


Mais uma golpada - Jorge Viegas Vasconcelos despediu-se da ERSE é uma golpada com muita classe, e os golpistas somos nós....
Era uma vez um senhor chamado Jorge Viegas Vasconcelos, que era presidente de uma coisa chamada ERSE, ou seja, Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, organismo que praticamente ninguém conhece e, dos que conhecem, poucos devem saber para o que serve.
Mas o que sabemos é que o senhor Vasconcelos pediu a demissão do seu cargo porque, segundo consta, queria que os aumentos da electricidade ainda fossem maiores. Ora, quando alguém se demite do seu emprego, fá-lo por sua conta e risco, não lhe sendo devidos, pela entidade empregadora, quaisquer reparos, subsídios ou outros quaisquer benefícios.
Porém, com o senhor Vasconcelos não foi assim. Na verdade, ele vai para casa com 12 mil euros por mês - ou seja, 2.400 contos - durante o
máximo de dois anos, até encontrar um novo emprego. Aqui, quem me ouve ou lê pergunta, ligeiramente confuso ou perplexo: «Mas você não disse que o senhor Vasconcelos se despediu?». E eu respondo: «Pois disse. Ele demitiu-se, isto é, despediu-se por vontade própria!».
E você volta a questionar-me: «Então, porque fica o homem a receber os tais 2.400contos por mês, durante dois anos? Qual é, neste país, o
trabalhador que se despede e fica a receber seja o que for?». Se fizermos esta pergunta ao ministério da Economia, ele responderá, como já respondeu, que «o regime aplicado aos membros do conselho de administração da ERSE foi aprovado pela própria ERSE». E que, «de acordo com artigo 28 dos Estatutos da ERSE, os membros do conselho de administração estão sujeitos ao estatuto do gestor público em tudo o
que não resultar desses estatutos».
Ou seja: sempre que os estatutos da ERSE foram mais vantajosos para os seus gestores, o estatuto de gestor público não se aplica.
Dizendo ainda melhor: o senhor Vasconcelos (que era presidente da ERSE desde a sua fundação) e os seus amigos do conselho de administração, apesar de terem o estatuto de gestores públicos, criaram um esquema ainda mais vantajoso para si próprios, como seja, por exemplo, ficarem com um ordenado milionário quando resolverem demitir-se dos seus cargos. Com a bênção avalizadora, é claro, dos nossos excelsos governantes.
Trata-se, obviamente, de um escândalo, de uma imoralidade sem limites, de uma afronta a milhões de portugueses que sobrevivem com ordenados baixíssimos e subsídios de desemprego miseráveis. Trata-se, em suma, de um desenfreado, e abusivo desavergonhado abocanhar do erário público.
Mas voltemos à nossa história. O senhor Vasconcelos recebia 18 mil euros mensais, mais subsídio de férias, subsídio de Natal e ajudas de custo. 18 mil euros seriam mais de 3.600 contos, ou seja, mais de 120 contos por dia, sem incluir os subsídios de férias e Natal e ajudas de custo. Aqui, uma pergunta se impõe: Afinal, o que é - e para que serve - a ERSE? A missão da ERSE consiste em fazer cumprir as disposições legislativas para o sector energético.
E pergunta você, que não é burro: «Mas para fazer cumprir a lei não bastam os governos, os tribunais, a polícia, etc.?». Parece que não. A coisa funciona assim: após receber uma reclamação, a ERSE intervém através da mediação e da tentativa de conciliação das partes envolvidas. Antes, o consumidor tem de reclamar junto do prestador de serviço. Ou seja, a ERSE não serve para nada. Ou serve apenas para gastar somas astronómicas com os seus administradores. Aliás, antes da questão dos aumentos da electricidade, quem é que sabia que existia uma coisa chamada ERSE? Até quando o povo português, cumprindo o seu papel de pachorrento bovino, aguentará tão pesada canga? E tão descarado gozo?
Politicas à parte estou em crer que perante esta e outras, só falta mesmo manifestarmos a nossa total indignação.

JÁ AGORA FAÇAM LÁ O FAVORZINHO DE REENVIAR PARA A V/ LISTA DE AMIGOS,
PELO MENOS SEMPRE SE FICA A SABER O QUE SE PASSA NO NOSSO PAÍS.

quinta-feira, abril 16, 2009

OS NOVOS POBRES. COITADOS!

vem no Jornal de Notícias, de 10.03.2009

Será que nunca mais se toma uma atitude para evitar esta pouca vergonha?

A crise quando chega toca a todos, e eu já não sei se hei-de ter pena dos milhares de homens e mulheres que, por esse país, fora, todos os dias ficam sem emprego, se dos infelizes gestores do BCP que, por iniciativa de alguns accionistas, poderão vir a ter o seu ganha-pão drasticamente reduzido em 50%, ou mesmo a ver extintos os por assim dizer postos de trabalho.
A triste notícia vem no DN: o presidente do Conselho Geral e de Supervisão daquele banco arrisca-se a deixar de cobrar 90 000 euros por cada reunião a que se digna estar presente e passar a receber só 45 000; por sua vez, o vice-presidente, que ganha 290 000 anuais, poderá ter que contentar-se com 145 000; e os nove vogais verão o seu salário de miséria (150 000 euros, fora as alcavalas) reduzido a 25% do do presidente. Ou seja, o BCP prepara-se para gerar 11 novos pobres, atirando ainda para o desemprego com um número indeterminado de membros do seu distinto Conselho Superior.
Será que nunca mais se toma uma atitude para evitar esta pouca vergonha?

Os novos pobres
JN 2009-03-10
A crise quando chega toca a todos, e eu já não sei se hei-de ter pena dos milhares de homens e mulheres que, por esse país, fora, todos os dias ficam sem emprego se dos infelizes gestores do BCP que, por iniciativa de alguns accionistas, poderão vir a ter o seu ganha-pão drasticamente reduzido em 50%, ou mesmo a ver extintos os por assim dizer postos de trabalho.
A triste notícia vem no DN: o presidente do Conselho Geral e de Supervisão daquele banco arrisca-se a deixar de cobrar 90 000 euros por cada reunião a que se digna estar presente e passar a receber só 45 000; por sua vez, o vice-presidente, que ganha 290 000 anuais, poderá ter que contentar-se com 145 000; e os nove vogais verão o seu salário de miséria (150 000 euros, fora as alcavalas) reduzido a 25% do do presidente. Ou seja, o BCP prepara-se para gerar 11 novos pobres, atirando ainda para o desemprego com um número indeterminado de membros do seu distinto Conselho Superior. Aconselha a prudência que o Banco Alimentar contra a Fome comece a reforçar os "stocks" de caviar e Veuve Clicquot, pois esta gente está habituada a comer bem.Aconselha a prudência que o Banco Alimentar contra a Fome comece a reforçar os "stocks" de caviar e Veuve Clicquot, pois esta gente está habituada a comer bem.

sexta-feira, abril 10, 2009

Nunca se deve dar poder a um tipo porreiro

Público, quinta-feira, 2 de Abril de 2009
O porreirismo de Sócrates, pela natureza do cargo que ocupa, criou um problema moral ao País.
No início, ninguém dá nada por eles. Mas, pouco a pouco, vão conseguindo afirmar o seu espaço. Não se lhes conhece nada de significativo, mas começa a dizer-se deles que são porreiros. Geralmente estes tipos porreiros interessam-se por assuntos também eles porreiros e que dão notícias porreiras. Note-se que, na política, os tipos porreiros muito frequentemente não têm qualquer opinião sobre as matérias em causa mas porreiramente percebem o que está a dar e por aí vão com vista à consolidação da sua imagem como os mais porreiros entre os porreiros. Ser considerado porreiro é uma espécie de plebiscito de popularidade. Por isso não há coisa mais perigosa que um tipo porreiro com poder. E Portugal tem o azar de ter neste momento como primeiro-ministro um tipo porreiro. Ou seja, alguém que não vê diferença institucional entre si mesmo e o cargo que ocupa. Alguém que não percebe que a defesa da sua honra não pode ser feita à custa do desprestígio das instituições do Estado e do próprio partido que lidera. O PS é neste momento um partido cujas melhores cabeças tentam explicar ao povo português por palavras politicamente correctas e polidas o que Avelino Ferreira Torres assume com boçalidade: quem não é condenado está inocente e quem acusa conspira. Nesta forma de estar não há diferença entre responsabilidade política e responsabilidade criminal. Logo, se os processos forem arquivados, o assunto é dado por encerrado. Isto é o porreirismo em todo o seu esplendor.
Acontece, porém, que o porreirismo de Sócrates, pela natureza do cargo que ocupa, criou um problema moral ao país. Fomos porreiros e fizemos de conta que a sua licenciatura era “tipo porreira”, exames por fax, notas ao domingo. Enfim tudo "profes" porreiros. A seguir, fomos ainda mais porreiros e rimos por existir gente com tão mau gosto para querer umas casas daquelas como se o que estivesse em causa fosse o padrão dos azulejos e não o funcionamento daquele esquema de licenciamento. E depois fomos porreiríssimos quando pensámos que só um gajo nada porreiro é que estranha as movimentações profissionais de todos aqueles gajos porreiros que trataram do licenciamento do aterro sanitário da Cova da Beira e do Freeport. E como ficámos com cara de genuínos porreiros quando percebemos que o procurador Lopes da Mota
representava Portugal no Eurojust, uma agência europeia de cooperação judicial? É preciso um procurador ter uma sorte porreira para acabar em tal instância após ter sido investigado pela PGR por ter fornecido informações a Fátima Felgueiras.
Pouco a pouco, o porreirismo tornou-se a nossa ideologia. Só quem não é porreiro é que não vê que os tempos agora são assim: o primeiro-ministro faz pantomina a vender computadores numa cimeira ibero-americana? Porreiro. Teve graça não teve? Vendeu ou não vendeu?
Mais graça do que isso e mais porreiro ainda foi o processo de escolha da empresa que faz o computador Magalhães. É tão porreiro que ninguém o percebeu mas a vantagem do porreirismo é que é um estado de espírito: és cá dos nossos, logo, és porreiro.
E foi assim que, de porreirismo em porreirismo, caímos neste atoleiro cheio de gajos porreiros. O primeiro-ministro faz comunicações ao país para dizer que é vítima de uma campanha negra não se percebe se organizada pelo ministério público, pela polícia inglesa e pela comunicação social cujos directores e patrões não são porreiros. Os investigadores do ministério público dizem-se pressionados. O procurador-geral da República, as procuradoras Cândida Almeida e Maria José Morgado falam com displicência como se só por falta de discernimento alguém pudesse pensar que a investigação não está no melhor dos mundos...
Toda esta gente é paga com o nosso dinheiro. Não lhes pedimos que façam muito. Nem sequer lhes pedimos que façam bem. Mas acho que temos o direito de lhes exigir que se portem com o mínimo de dignidade. Um titular de cargos políticos ou públicos pode ter cometido actos menos transparentes. Pode ser incompetente. Pode até ser ignorante e
parcial. De tudo isto já tivemos. Aquilo para que não estávamos preparados era para esta espécie de falta de escala. Como se esta gente não conseguisse perceber que o país é muito mais importante que o seu egozinho. Infelizmente para nós, os gajos porreiros nunca despegam.